domingo, 26 de julho de 2009

 

água salgada no canto do bar nunca é bom anúncio.

a porta teve atenção como antigamente

Ela não vem

mais

há muito tempo

Eu que fiquei

medíocre

e meu nome não incita

recordações

nem ventania

na barriga

 

terça-feira, 21 de julho de 2009

PAUSE


Na sala discutiam pizzarias e espirros. Que a covinha do presidente apareceu quando começou a raspar os pelos do rosto. A televisão ligada bisbilhotava algum cenário da novela das oito. Perguntaram-lhe como andava o trabalho. Alice deu de ombros e foi até a janela. Alguém insistiu Já conheceu o meu amigo do financeiro? Alice ignorou a pergunta, talvez porque também ignore o tal amigo. Desligaram a TV e cochichos desculpavam-se pela dificuldade que ela desenvolveu para assistir a novelas. No céu a lua apagava-se lentamente. Por seis minutos a escuridão hipnotizaria Alice. Um momento que inspira silêncio e contemplação. Nada de Brasília e vírus. Instantes que demoram a voltar. Disseram 123 anos. Quando ela for ossos ou cinzas. A vida poderia ser mais previsível como a data de hoje. Algum físico poderia dizer-lhe em que oceano ela vai desaguar? Alice pulou a janela para deitar-se na grama úmida do jardim e esvaziou os conflitos habituais da cabeça. Criaria um novo. Tenho apenas seis minutos para aproveitar. Encaixou as mãos entre folhas e nuca. E os olhos, na sombra redonda.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

DAQUI...

Daqui.
Do outro lado da praia contemplo a sua música, enquanto escrevo as próximas páginas - dores paridas me enjoam. Não me reconheço no ontem.
Daqui. Inalo a melodia. Trilho meu tom seguinte. Tão grave... Te agrada? Eu sei que não.
Porque abandono esse lamento pedinte por folhas impreenchíveis, fadadas ao cesto de lixo do meu corpo.
Sua letra inunda calma o lado de cá. A espuma toca unhas assustadas, me encara.
Daqui. Sussurro seus acordes. A distância tapa seu ouvido.
E eu não sei se devo cantar mais alto.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

FORASTEIRA

*

A MOÇA está de pé. Calça jeans. Cabelo solto voando. Um chão seco e batido embaixo de sua bota. Vemos um raio de luz furando as nuvens cinzentas do céu e manchando o corpo dela. Ouvimos uma música com volume bem baixo, não conseguimos identificá-la ainda. Cheiro de cerveja. A luz do sol preenche a cena e um sorriso, o rosto dela...

*

segunda-feira, 13 de julho de 2009

CORRE. CORRE MESMO...

Corre. Corre mesmo. Naquela direção. Pula. A timidez enlaça intensa o corpo bruto desviante. O corpo desamarrando-se insensato. Incapaz de se embaralhar. As pernas cansadas desistem. Tocam a realidade do cimento. Vão pra casa esquecer. Ligar a televisão. Beber cerveja. Arrumar a cama. Dar banho no gato e planejar o novo salto. Inventar o novo texto. A modulação do toque. O tamanho do olhar. O escudo da próxima vez.

Inspirado em uma frase que li em um blog amigo.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

O QUE SEI DESSES...

O que sei desses tempos? Não os encomendei. Não os aceitei. Não os compreendo. Nem em gestos irresponsáveis sugeri que se aproximassem. Que fiz eu? Agora se enrolam em mim. Transformaram-me em estátua. Taparam-me as narinas. Meus bruscos escapes não ornam com mais nada. Escorrego delicada e lentamente. Outros tempos. Uma seda deslizando em um abraço noturno. Visando um dia o chão e pés. Lágrimas manchando sapatos, implorando centavos. Romântica e estúpida mania. Focos desviados durante interesses ditos. Que quero eu? Uma porta calada, sua chave esquecida. Que pretendo agora?
Evaporar...

sexta-feira, 3 de julho de 2009

ALICE

Aquela padaria me lembra Alice. Não porque já estivemos juntas lá. Nem porque ela me segredou que o pingado deles é o melhor da cidade. Mas por causa de um rapaz que expôs para a pessoa ao lado que se lembrava de Alice sempre que passava por aquela padaria. Estava na minha frente na fila do teatro. Quem falava de Alice? Da minha Alice. A que presente ela pertence, do qual agora me exclui? Senti ciúme e desde então troco a rua e o semáforo pela padaria quando passo por ela. Alice pode estar lá. Me apropriei da memória de um estranho. Fiz a relação dele com Alice tornar-se minha também. Por quê? Se o que tínhamos era tão mais profundo que a imagem dela sentada num balcão tomando refrigerante ou pagando a conta com seu cartão de crédito? Eu pensava em Alice quando ouvia uma música dos Beatles na rádio. Eu pensava em Alice quando me perdia em seu bairro por causa de entrevistas fracassadas de emprego. Ou mesmo quando, sem querer, abria o guia de ruas em alguma página da Bela Vista. Às vezes colocava o vinil de qualquer um - Pavarotti, Caetano, Aretha – só pra ouvir o chiadinho debaixo de suas vozes. O chiadinho hipnótico aos olhos profundos e escorregadios de Alice. Decorei um parágrafo inteiro de seu segundo romance e, meio bêbada, meio impulsiva, recitei para ela no meio de uma festa. Alice não se lembrava de ter escrito nada do que naquele momento ouvia junto com a música. Talvez não fosse mais a dona daquele desabafo. Quando você voltar, eu vou arremessar no seu cinismo todas as flores que ganhei. Você vai espanar as pétalas que escorreram para o ombro e partir. Quando estiver a cinco passos de mim, vou cantar aquela música que você não decora. Você vai voltar e provar que prestava atenção quando eu te ensinava. Eu vou ouvir, séria. Vai me olhar com a mesma expressão de quando leva bronca, pegar a rosa mais despetalada do chão e entregá-la a outra, como você sempre faz. Eu vou desligar a sua cena e tomar o copo de cerveja para não mostrar que minhas mãos tremem. Vou esperar no balcão alguém com um ramalhete. E quando você voltar eu vou atirar mais flores na sua cara e depois que você cantar pra mim, eu volto pra você. Você sabe. Eu volto. Ela me disse Não sou eu. Mas essa ideia de Alice ainda me toma. A padaria da qual o rapaz se referiu é só uma tentativa de não tirar Alice das minhas páginas em branco. Mas ela costuma evaporar sempre que me aproximo. Um avanço obrigatório ao fim do seu livro. Páginas virando sem o meu consentimento. A vontade de se tornar mais uma de minhas lembranças. A lembrança de uma padaria. A lembrança de um nome. Alice.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

BIG BLOGGER

Engraçada essa coisa de blog. Alguns, tenho a impressão, de que escrevem pra si mesmos - o que pra mim é a única razão da escrita: eu mesma. É que post sem comentário... Não dá vontade de colocar aquele barulhinho de grilo? Parece que ninguém lê. Mas é mentira. O público existe, meus amigos. Só é meio fantasma. Nossos blogs são como um quarto em que há uma pessoa trocando de roupa. A fechadura está lá. Quem não tem vontade de dar uma espiadinha? Afinal, se a minha toalha tá caindo, é porque quero que vejam. E quem é você pra não presenciar o momento em que ela toca o chão?
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